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Este é o 24º artigo de 46 posts da série Entre Homens e Lobos.

Ridículo, Dareon pensava, encarando de longe a entrada esquisita da tal serraria do Bradshaw. Tão assustador que chega a ser ridículo. Aquilo tudo parecia mentira, quando pensava bem, analisando todas as situações absurdas pelas quais tivera de passar para chegar até ali, sozinho e desprotegido, sem fazer ideia de quem era aquele misterioso autor do diário pelo qual Lorna estava obcecada – e que, por alguma razão idiota, ele havia assumido a missão de encontrar.

“Para o bem ou para o mal”, como a própria Lorna dissera antes de se despedir, ainda meio carrancuda porque Dareon a proibira de tentar segui-lo para se embrenhar na Floresta Negra em busca daquele maluco. No fundo, ela sabia que aquela podia ser mais uma tentativa inútil de descobrir qualquer coisa.

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Demorara o dia todo para encontrar a maldita serraria, que parecia se esconder junto com Bradshaw. Já de longe, Dareon fora recepcionado por um alto moinho quebrado, de aparência nada convidativa, o tipo de coisa que o fazia se perguntar porque é que ainda insistia em se meter naquelas situações. Podia ter ficado quieto, pensava, mas logo em seguida uma outra questão surgia para confrontá-lo: e então que diferença eu faria no mundo?

Àquela altura, no coração da Floresta Negra, qualquer brisa o alarmava, qualquer barulho fazia suas orelhas se erguerem involuntariamente. Seu olfato aguçado procurava no ar a fonte do cheiro adocicado que começara a sentir havia alguns minutos, um perfume que parecia vir de todos os lados, espalhando-se pela névoa. De longe, encarava a velha serraria e ela parecia lhe encarar de volta, rangendo suas madeiras soltas e pregos enferrujados como se o estivesse confrontando. Algo não estava certo ali, Dareon sabia, apesar de não se sentir realmente ameaçado. Sentia-se apenas agitado.

Vagarosamente, começou a se aproximar da serraria abandonada, lutando contra o próprio instinto para não rosnar muito alto ou arranhar os dentes com força demais. Alguém precisa descobrir o que aconteceu aqui, tentava se convencer, enquanto colocava pata ante pata na grama úmida e escura, pisando sobre as flores esmagadas que beiravam a estrada envelhecida até a serraria.

Não via qualquer sinal de Bradshaw, mas talvez fosse uma coisa boa. “Não se iludam demais”, havia dito Gwen Armstead quando Dareon e Lorna lhe contaram sobre o mistério do diário, mas, a despeito das chances, ali estava ele, encarando uma lamparina acesa enquanto tomava coragem para entrar na serraria – ou seja lá do que aquilo poderia ser chamado no estado em que se encontrava.

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Então, finalmente, entendeu o que estava errado. Essas lamparinas acesas… Era óbvio que alguém as acendera havia pouco tempo, a julgar pela intensidade com que brilhavam, chamando atenção em meio àquela escuridão agourenta. Ao olhar para trás, constatou o caminho de lamparinas que havia seguido sem se dar conta, todas acesas, um lastro de luz reconfortante, completamente alheio à penumbra da Floresta.

Instigado, Dareon examinava o chão até onde a luz o permitia. E ainda sentia aquele cheiro. Por um momento, pensou que podia ser o aroma da fumaça enegrecida que se soltava na medida em que as lamparinas queimavam, mas foi só se aproximar alguns passos para perceber que era algo diferente.

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Era um perfume doce, quase tranquilizante, que formava uma trilha pela curta estradinha que levava até a serraria. Ficava mais forte a cada passo, aquele perfume estranho, aquele cheiro que certamente não pertencia naturalmente ao local. Com seu olfato aguçado, Dareon andava com a cabeça baixa, farejando o solo enquanto procurava alguma pista de qualquer um que pudesse ter estado ali nos últimos minutos.

Sentia que estava perto de encontrar algo, só desejava que fosse bom. Estranhamente, a despeito de todas as circunstâncias, ainda não se sentia ameaçado – estava apenas apreensivo. De frente para a entrada da serraria, farejou mais uma vez. Cheiro de flores, pensou, agitado, antes de dar mais um passo. De repente, foi tomado por uma série de lembranças boas, algo escondido bem no fundo da sua memória de humano, coisas em que não conseguia pensar desde que fora transformado. Decidiu que aquela sensação era algo perto da felicidade. Era harmônico, era… colorido.

Assim que ergueu a cabeça, dois olhos brilhantes o encararam de dentro da serraria. Dareon se assustou e mostrou os dentes instintivamente, rosnando alto, as quatro patas no chão. Por um momento, tornou-se o animal que era, ameaçador e selvagem, mas nada pareceu abalar aquelas duas lanterninhas assustadoramente cintilantes, que lhe responderam com duas piscadelas rápidas. Um instante depois, uma figura alta e branca moveu-se alguns centímetros para o lado e deixou que a luz do luar iluminasse seu corpo.

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De longe, os dois se olharam. Dareon ergueu as orelhas, desconfiado, enquanto analisava aquela criatura absurdamente pálida. Tinha cabelos arroxeados e, se sua visão não o enganava, também podia ver alguns desenhos pintados em seu rosto. Já havia viajado pelo mundo o suficiente para saber o que ela era, mas estava escuro e Dareon não conseguia acreditar que de fato havia uma elfa ali.

Lá de dentro da serraria abandonada, ela sorriu e acenou. Dareon olhou para os lados, ainda sentindo que aquilo tudo era algum tipo de alucinação, e finalmente decidiu acenar de volta. Lentamente, caminhou em sua direção – como se temesse que ela fosse desaparecer se ousasse respirar muito alto ou pisasse em algum galho quebrado por acidente.

– O-olá? – disse Dareon. Ou talvez tenha apenas rosnado, não tinha certeza.

A elfa noturna jogou seus cabelos coloridos para trás e sorriu novamente. Dareon notou como cintilava majestosamente sob o brilho da lua, os olhos tão luzidios que pareciam enxergar até sua alma. Era alta e forte, aquela criatura, e por alguma razão Dareon sentia-se feliz por estar ao seu lado.

– Eu estava esperando por você – disse ela, e sua voz soou tão acolhedora que Dareon decidiu que gostaria de ouvi-la para sempre. – Não se assuste.

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Não se assuste, Dareon repetiu mentalmente. Geralmente era ele quem dizia aquilo às pessoas, e a sensação de ouvir o pedido o fez se sentir ainda mais vulnerável. Não bastasse isso, nada do que já havia passado até ali o deixara tão apreensivo quanto o que a elfa disse a seguir:

– Meu nome é Belrysa Brisastral. Sou uma Sacerdotisa da Lua… Uma elfa noturna – ela parou por um instante. – Você pode não conhecer meu povo, mas o destino de nossas raças está unido desde que a Maldição se abateu sobre vocês.